Uma reflexão sobre a hora certa de mudar

Ao longo de minha carreira corporativa, sempre estimulei os processos de transformação pessoal e de busca por objetivos verdadeiros que, no fim das contas, são o estopim da inovação e de uma empresa guiada por mentes autênticas. Afinal de contas, só quando estamos inseridos em um contexto profissional que dialoga diretamente com nossos valores, que nos tira da zona de conforto e nos impulsiona a evoluir, podemos ser, de fato, disruptivos, revolucionários e criadores.

Nesse mesmo sentido, quando meus colaboradores viam que esse senso de propósito estava sendo aprimorado na organização em que atuávamos em conjunto como equipe, maravilha!

Do contrário, eu era a primeira a incentivar – após um diálogo franco e entendimento dos anseios daqueles profissionais – que buscassem novos caminhos em prol da plenitude ou daquilo que Abraham Maslow classificou como autorrealização e que, no trabalho, se relaciona com o crescimento pessoal, maior percepção de autonomia, poder decisório e o entusiasmo diante de novos desafios.

E o fato é que essa busca pelo propósito na carreira está intrinsecamente ligada ao perfil das novas gerações que vão se inserindo no mercado de trabalho e que formarão o quadro das futuras lideranças no Brasil e no mundo.

De acordo com dados de uma pesquisa da Adobe divulgado pela Forbes no ano passado, por exemplo, cerca de 56% da geração Z (18 a 24 anos, em média) pretendem mudar de emprego em 2022, enquanto um estudo realizado na Inglaterra apontou que o turnover de jovens dessa geração é 16% superior quando comparado com outros grupos etários. Por fim, diferentes análises ressaltam, justamente, o fator propósito como motor principal de carreira dos nativos digitais.

Em contrapartida, não muito tempo atrás, existia uma percepção corriqueira no ambiente de negócios brasileiro de que um profissional deveria permanecer X anos em uma empresa; do contrário, correria riscos de ter sua reputação afetada no mercado e, consequentemente, de não atrair a atenção de organizações relevantes dentro de seu eixo de atuação.

Mas o fato é que não só essa prerrogativa passa longe de ser uma verdade absoluta – e eu sou uma prova viva dessa afirmação, haja visto que, a partir do momento que sentia que minha trajetória estava concluída em uma companhia, nunca hesitei em dar um novo passo –, como o que de fato importa nessa equação é ter uma visão clara do que se ambiciona em termos de carreira e de vida.

Mas, de modo objetivo, como mensurar a hora certa de mudar? Ou, em outras palavras, qual o meu “prazo de validade” em uma empresa?

Há, de fato, um momento certo para a busca pelo novo?

A complexidade do questionamento em torno da hora certa de mudar reside no fato de que essa reflexão envolve tanto fatores internos, quanto questões mais objetivas relacionadas a nosso momento de carreira e existência.

Nesse sentido, não há um mapa da mina único que possa ser adequado para a realidade de todos nós. Você precisará desenhar o seu mapa e construir suas rotas de mudança. Feita essa observação, há alguns sinais que você deve saber interpretar para utilizá-los como guia nesse movimento – que nada mais é do que um processo de auto entendimento – assim como, ações objetivas em prol da transformação.

No plano essencial, pois, você deve refletir continuamente sobre seu propósito na organização em que atua. Aquele trabalho te motiva? Os desafios que o cargo lhe oferece são encarados como uma fonte de satisfação? Você se sente valorizado, com espaço para crescimento ou que suas ideias são ouvidas?

Todas essas questões devem ser avaliadas quando pensamos em nosso “prazo de validade organizacional”. E perceba que essa é uma via de mão dupla: tanto você pode sentir, enquanto profissional, que chegou o momento de abrir as asas em direção a outros horizontes; quanto a companhia achar que você não gera mais valor para o negócio.

Aliás, a falsa presunção da segurança é um dos maiores equívocos na hora de decidirmos por mudar ou não de uma empresa. Como bem afirmou Dale Carnegie, “toda vida é um risco” e quem vai mais longe “é geralmente aquele que está disposto a fazer e a ousar. O barco da ‘segurança’ nunca vai muito além da margem.”

No plano objetivo, uma série de ações podem ser tomadas para uma mudança no curto, médio ou longo prazo. Você pode, por exemplo, avaliar suas reservas financeiras para um eventual período de instabilidade, elaborar um plano de desenvolvimento pessoal, participar de cursos e expandir suas perspectivas de conhecimento ou mesmo engajar-se em processos de coaching e mentoring visando o aprimoramento (e a possível descoberta) de novas habilidades e anseios.

Mas, novamente, é válido ressaltar que cada trilha de carreira e de vida é pessoal. Seu momento de mudança pode ser o agora – e você pode ajustar seus caminhos ao longo do processo – ou fomentar a transformação aos poucos. O importante é a convicção, o saber se ouvir e a coragem, pois todo caminho traz consigo desafios.

Comodismo ou escolha?

 E o desafio que motiva, inclusive, pode estar na empresa na qual você já se encontra. Nesse sentido, é preciso que não se confunda o movimento, a inquietude e a transformação – pilares, vale frisar, de minha atuação focada em desenvolvimento humano e organizacional – com a obrigatoriedade em mudar de companhia.

Conheço muitos profissionais que se sentem verdadeiramente realizados em empresas nas quais atuam há longos períodos e para os quais há novos e contínuos projetos que os instigam a continuar naquela organização.

Assim, do mesmo modo que a busca por um novo passo na carreira é um ato de coragem quando seguimos nosso instinto, a permanência – desde que ligada a um propósito e não ao comodismo – também é um valor genuíno.

Por fim, tenhamos em mente que, permanecendo ou não em uma companhia, sendo abertos ou resistentes à transformação, do ponto de vista filosófico, a mudança nos é intrínseca e, como diriam os antigos, a única coisa permanente.