Que cultura queremos construir?

A jornada de expansão de uma companhia é permeada por desafios que, para serem superados, exigem esforços multidisciplinares, liderança estratégica e ações estruturadas, as quais devem levar em conta que, para além dos números e da eficiência, cada organização é também um ecossistema humano e relacional que precisa ser compreendido em toda sua pluralidade e dinamismo.

Pensemos, de modo mais detalhado, no processo de aquisição de empresas. Estamos falando de um grande passo para a consolidação do posicionamento de mercado de uma corporação, mas também de uma das etapas mais complexas na história de um negócio e que, tão por isso, exige muito mais do que a simples ambição de crescimento. Não por acaso, de acordo com a Harvard Business Review, 70% a 90% das fusões falham. Quais as razões por trás desse cenário?

Ao analisarmos diferentes perspectivas do mercado, podemos colher algumas pistas valiosas nesse sentido.

Um interessante artigo da Forbes Council Coach, por exemplo, alerta justamente para o fato de que, aliado à falta de entendimento dos fatores de sucesso da empresa adquirida e de falhas de integração (pacto social) entre as lideranças, usualmente há um profundo desconhecimento sobre as pessoas que compõem o negócio adquirido – e, consequentemente, da cultura daquela organização e de como ela irá se relacionar com a cultura de minha companhia.

E, como bem observa a análise, o capital humano, diferente do capital físico, não pode ser simplesmente transportado de um lugar para o outro sem qualquer estudo dos riscos relacionais envolvidos.

A autenticidade do novo

Em minha experiência corporativa e de consultoria com organizações de diferentes segmentos, percebo ainda outro aspecto que merece ser ressaltado: muitas vezes, as lideranças ignoram o fato de que a cultura organizacional é um elemento resiliente e, como tal, não se transforma do dia para a noite. Aliás, a própria tentativa de replicar a estrutura cultural de uma companhia naquela que está sendo adquirida é um traço que denota pouca abertura para uma transformação genuína.

Mas o que é o crescimento, se não um movimento contínuo de mudança, aprendizagem e aperfeiçoamento? Ambas as empresas precisam entender que, a partir do momento em que uma fusão ou aquisição se concretiza, uma nova dinâmica cultural e corporativa está se criando. Nesse sentido, ficar preso a modelos organizacionais anteriores a essa etapa (seja da empresa adquirida ou da adquirente) tende a dificultar ou mesmo inviabilizar o sucesso do negócio.

Em outras palavras: mais do que se aferrar a uma cultura antiga, é preciso construir um novo e autêntico ecossistema cultural, com base na multiplicidade de elementos que agora formam o todo da empresa – processos, talentos, objetivos e valores.

Construindo uma nova cultura passo a passo

Se você ainda tem dúvidas do quão complexo é esse movimento, vale citar um dado da PwC que reforça que 65% das empresas em expansão relatam que a principal dificuldade para a geração de valor em uma aquisição está relacionada a problemas e questões de ordem cultural. Mas como superar esse desafio? Eis a questão.

Embora não exista uma receita mágica que garanta o sucesso na construção de uma nova cultura, diferentes estudos atestam para algumas etapas importantes.

O primeiro deles envolve o diálogo e a capacidade de negociação. É preciso identificar os pontos de intersecção cultural, valorizar as lideranças (formais e informais) que podem contribuir para essa construção, os pontos fortes da companhia adquirida – capazes de agregar valor ao negócio – e os ruídos/resistência que precisam ser analisados sob o prisma da negociação, da capacidade de se ouvir e da visão estratégica para que ações inteligentes sejam desenhadas.

Outro ponto importante envolve a experimentação e, inclusive, o entendimento de que, em toda transformação cultural mais profunda, há uma curva de aprendizado em que erros e acertos compõem a busca por um ponto de equilíbrio.

Por fim, é preciso novamente reforçar que a construção de uma cultura se faz, sobretudo, com a abertura para a mudança e que esse intuito deve partir dos líderes do negócio – os quais serão responsáveis por propagar esse desejo em todas as camadas da companhia. Afinal de contas, o processo de crescimento é também uma escolha. Escolha essa que tem como uma das bases a definição da cultura que a companhia deseja construir, renovar e recriar de modo contínuo ao longo de sua jornada.

Este artigo foi publicado pela Think Work.