Você já se rendeu à falta de compliance?

Investimentos em conformidade crescem, mas são abalados diante de crises. Qual o papel dos líderes?

“Integridade é fazer a coisa certa, mesmo quando ninguém está olhando.”

A frase acima, do escritor irlandês C.S. Lewis traduz de modo preciso meu entendimento sobre ética e caráter, pois ela revela com uma clareza singular os princípios da transparência, do alinhamento entre valores íntimos e nossa atuação social e traz consigo as ideias de que não basta demonstrar retidão publicamente, precisamos carregar de modo autêntico uma perspectiva de idoneidade.

Ao mesmo tempo, ela se coloca como um farol para um período em que parecemos tão desiludidos na busca pela ética das instituições, empresas e sociedade como um todo. Afinal de contas, vivemos uma crise do caráter? Analisamos o contexto brasileiro, esse cenário é contraditório.

Nos últimos anos, por exemplo, o Brasil passou por um movimento profundo de reavaliação de suas práticas corporativas.

No copo meio cheio desse debate, as empresas do país e mesmo órgãos do Estado investiram significativamente em compliance, estabelecendo normas e processos em prol de maiores níveis de transparência e integridade nos negócios e na administração pública – muito, é verdade, em resposta a crises institucionais de corrupção fartamente abordadas pela mídia.

Nesse sentido, um estudo da Deloitte aponta que 73% das empresas pretendem intensificar investimentos em compliance ainda em 2024. Já em 2023, aliás, a América Latina como um todo investiu cerca de US$ 15 bilhões em compliance, alta de 97%, conforme dados da Lexis Nexis Risk Solutions.

Mas o cenário conflita com um fato muito comum: diante de uma crise econômica ou organizacional, a área de compliance – em conjunto com processos de desenvolvimento de pessoas – geralmente é a primeira a sofrer com cortes de orçamento.

Essa é uma decisão incongruente: enquanto o discurso de ética permeia estratégias empresariais, na prática, esses valores são sacrificados em nome da sobrevivência de curto prazo. Mas será que essa escolha é sustentável em um mercado que exige mais transparência e culturas que fomentem ética e caráter?

Para encontrarmos respostas para uma crise que desgasta princípios que deveriam ser inegociáveis, é importante investigarmos as raízes dos conceitos de ética e caráter. Quem sabe, com isso, consigamos entender porque eles têm sido ignorados e como trilhar caminhos mais íntegros.

 

Caráter e compliance como valores públicos e privados

Aristóteles explica que o caráter está relacionado com a busca e a expressão da virtude, a partir de hábitos que devem ser aprimorados, trabalhados continuamente na direção do equilíbrio, da mediania moral e da temperança.

Essa visão sustenta filosofias como a accountability. Ela explica que, a partir de atitudes éticas e responsáveis, independentemente das circunstâncias, contribuímos para o bem coletivo e para o nosso próprio desenvolvimento. Nessa jornada, podemos cometer erros, mas, se somos sustentados por uma cultura com valores de idoneidade, eles se tornam fontes de aprendizado.

Curiosamente, essa ideia contrasta de modo direto com o chamado “jeitinho brasileiro”, que relativiza a busca pelo bem na troca por benefícios de curto prazo. Assim, se queremos uma sociedade justa e com líderes de caráter, devemos começar por uma mudança cultural e educacional que permita que as futuras gerações se orientem por novos princípios capazes de fortalecer a confiança nas relações humanas.

O mesmo vale para as áreas de compliance: elas não podem ser relegadas diante do primeiro sinal de crise. Seu papel é estratégico, inclusive, para a atração de investimentos na era do ESG e da governança que impera no mercado de capitais.

Logo, para que sejam bem-sucedidos, os processos de compliance não podem ser parte de um simples discurso, mas incorporados na cultura da empresa e nas atitudes de seus líderes e colaboradores.

 

Compliance e desenvolvimento de pessoas: dois lados de uma mesma moeda

Precisamos ter em mente que os investimentos em compliance e desenvolvimento humano são, na verdade, duas bases inseparáveis para uma cultura forte.

Programas de treinamento e capacitação que focam em valores éticos e na construção do caráter são fundamentais para uma organizacional sólida; enquanto empresas que enxergam o compliance como uma mera despesa, falham na compreensão de que, sem governança, perde-se a visão de longo prazo e todo o legado de um negócio pode se perder diante de processos e pessoas corruptíveis.

Assim, ao investirem em compliance e desenvolvimento, as empresas estão construindo um amanhã mais íntegro para o mercado e de potencial sucesso para os seus negócios.
Qual a sua escolha enquanto líder: render-se à falta de compliance ou construir um futuro promissor?