A tendência ‘Quiet Ambition’ e os novos pilares da carreira corporativa
“Quais fatores movem a sua carreira? O que você ambiciona para o futuro? Se fizéssemos essas perguntas há 30 anos, não precisaríamos de uma bola de cristal para mensurar que muitas das respostas girariam em torno da busca por estabilidade, progressão horizontal para cargos executivos e ganhos financeiros que compensariam a lógica de que, com “grandes poderes”, temos “grandes responsabilidades”.
Era um mundo corporativo mais claro, objetivo, mas também muito menos permeado pela corrida da inovação, luta pela construção de ambientes de trabalho mais humanizados, sustentáveis, plurais e colaborativos; pelo entendimento de que a saúde mental é tão importante quanto o sucesso.
Uma das belezas do universo da gestão de pessoas é justamente a mudança… Acompanhando os debates nos meios especializados de RH, um dos novos conceitos que se coloca como desafio para as organizações envolve o conceito de Quiet Ambition (Ambição Silenciosa), termo que traduz uma tendência de jovens profissionais cada vez menos interessados em cargos de liderança – ou ao menos em postos de gestão tradicional.
Em uma pesquisa conduzida pelo consultor de carreira de Harvard Gorick Ng, menos de 2% dos profissionais da geração Z almejam alcançar altos postos no mundo corporativo. Em outro levantamento da empresa canadense Visier, os dados seguem no mesmo sentido:
- 62% dos entrevistados preferem continuar em seu cargo atual;
- Apenas 38% querem ser gestores de equipes;
- E uma porcentagem mínima de 4% apontou o desejo de ocupar postos de alta gestão executiva.
Mas o que afasta as novas gerações dos cargos de liderança é uma incompatibilidade definitiva para conduzir talentos ou uma quebra de paradigmas sobre carreira que, em sua essência, pode influenciar positivamente o modo como enxergamos a gestão de pessoas?
Entendendo a tendência “quiet ambition”
Para responder a pergunta, vale cruzarmos os dados das pesquisas citadas com outros indicadores relevantes que nos ajudarão a entender porque, na minha visão, não estamos diante de uma geração sem líderes – mas sim, de uma necessidade urgente de transformação cultural por parte das organizações.
No próprio estudo de Harvard também identificou-se que os novos profissionais almejam ganhar bem e ter estabilidade financeira. A diferença é que esses anseios precisam caminhar em conjunto com os interesses no equilíbrio entre vida pessoal e profissional, em gerar impactos positivos e no empreendedorismo.
Outro levantamento, da MIT, descobriu que os jovens da geração Z têm como prioridade nos trabalho, respectivamente, os horários flexíveis; a oferta de bônus e planos de saúde de qualidade; de academia ou creche nos espaços corporativos; e até a possibilidade de fazer trabalho voluntário durante o expediente.
A Visier identificou ainda que o tempo de qualidade com família e amigos, a busca por saúde física e mental; e o desejo de viajar lideram as prioridades das novas gerações.
Assim, duas primeiras convicções se impõem de modo mais evidente:
- A gestão de RH deve, definitivamente, entrar no radar das definições estratégicas das organizações;
- Nesse escopo de definições, estruturar novos modelos organizacionais é um passo desafiador, mas possivelmente essencial para a transição de lideranças.
A sobrecarga da gestão e a hora de mudar
Falar de novos modelos organizacionais é importante porque as pesquisas indicam ainda que as razões que afastam as novas gerações dos cargos de gestão são o excesso de pressão, estresse e a impossibilidade de conciliar interesses pessoais e profissionais.
O “erro” não está na geração Z ou em quem deseja ter saúde mental e ser feliz no trabalho, mas sim, em estruturas corporativas que, por muito tempo, normalizaram a sobrecarga e confundiram eficiência com burnout. Em relação a isso, uma pesquisa de 2022 da Future Forum apontou que 45% dos gerentes intermediários nas empresas se diziam esgotados.
Os novos perfis de liderança e as pistas estratégicas para as empresas
Diante de tantas informações acredito que é mais do que possível que as corporações construam novas jornadas de liderança pautadas em algumas diretrizes:
- OUVIR é imprescindível. Insistir para que haja, na atuação do líder, tempo e espaço para entender os anseios e desejos de cada colaborador;
- Apoiar o intraempreendedorismo e aos projetos individuais dos seus talentos;
- Ofertar remunerações e benefícios atraentes (o reconhecimento financeiro segue sendo um importante pilar);
- Desenhar jornadas flexíveis (a entrega é mais importante do que bater ponto);
- Abraçar modelos estruturais mais arrojados, inovadores, como a semana de 4 dias ou o trabalho híbrido. Se possível for, dar a chance do colaborador escolher o melhor modelo para ele, abrindo espaço para uma maior conciliação entre vida profissional e pessoal;
São pistas importantes que estão sendo deixadas e que podem, por fim, modelar a gestão de pessoas e a formação de novos líderes. Mas para isso você precisa saber ouvir a revolução silenciosa!
*Artigo publicado na Revista Gestão RH #164 (Páginas 20 e 21)