Desde que o mundo é mundo, o jargão do “cliente em primeiro lugar” é um imperativo difundido entre empresas dos mais diversos portes e segmentos. Mas, como também sabemos, a distância entre um discurso e a prática real, não raro, é vasta e, por um longo período – sobretudo dentro do contexto de uma economia ainda analógica – a verdade é que a ciência do relacionamento com consumidores (e clientes internos) não foi suficientemente sistematizada no país.
Esse cenário começou a se transformar com o surgimento, na década de 50, das primeiras faculdades de administração no Brasil e o fortalecimento gradativo das áreas de recursos humanos, mas ganhou um boom significativo dentro do processo de digitalização do mercado e com a expansão de negócios digitais que empunharam a bandeira do customer experience como um diferencial competitivo frente às grandes companhias do mercado.
Hoje, mais do que um elemento de diferenciação, a atenção à experiência de clientes internos e externos é uma necessidade elementar dentro de um ambiente de negócios guiado pelos paradigmas da personalização.
Diferentes dados comprovam essa tese: um estudo da SalesForce divulgado no final de 2020 apontou que cerca de 66% dos consumidores esperam que as marcas entendam suas necessidades e expectativas, ao passo que, em 2021, a McKinsey destacou que nada menos que 71% dos clientes busca experiências personalizadas – enquanto 75% deles se sentem frustrados quando não há esse retorno por parte das empresas.
Não por acaso, as organizações centradas no cliente (customer-centric companies), segundo um amplo report da Deloitte – demonstraram ser até 60% mais lucrativas do que aquelas sem práticas coordenadas com foco na experiência. E esse potencial de lucratividade, aliás, aumenta quando os líderes estão empenhados nessa missão única e desafiadora de colocar o cliente – de fato – no centro de seus negócios. A Forbes, por exemplo, indicou que 64% das empresas com um CEO focado em customer experience geram um retorno financeiro mais sólido, quando comparadas com seus competidores que não o fazem.
Dito isso, no Brasil, é possível enxergar esse contexto da era da experiência tanto pelo prisma do copo meio cheio, quanto do copo meio vazio. De um lado, por exemplo, é positivo observar que mais de 70% das empresas brasileiras direcionaram investimentos para a criação de uma área de CX já em 2021 – em contrapartida, cerca de 32% dos negócios não tinham, sequer, um plano de ação para os feedbacks de seus clientes, conforme observado em levantamento da Track.
Nesse sentido, é possível chegarmos a duas conclusões distintas e igualmente importantes:
● O entendimento sobre a importância da experiência do cliente é uma realidade no país e, em maior ou menor escala, começa a movimentar as empresas que desejam se manter competitivas;
● Há ainda um gap que precisa ser sanado em termos da construção metodológica e de processos de CX nas organizações.
Por sua vez, a superação desse desafio, na minha visão, começa com um passo aparentemente simples, mas indispensável em qualquer grande ação transformadora dentro de uma companhia: o planejamento ou, mais especificamente, da estruturação de um mapa da experiência do cliente, a rota que nos auxiliará no entendimento, conversão e fidelização de clientes internos e externos.
O mapa da experiência do cliente
Há diferentes bases conceituais para a construção de um mapa de experiência, sendo que, muitas delas, passam por diretrizes semelhantes aos postulados do modelo que apresento a seguir, que envolve três fases:
● A fase de conhecimento: quando cliente (interno ou externo), tem o contato inicial com nossa empresa;
● A fase de consideração: quando o consumidor, colaborador ou stakeholder está avaliando iniciar uma relação com a companhia (seja ela de consumo, do fornecimento de produtos ou serviços, de investimento, etc.);
● A fase de conversão: momento crucial de tomada de decisão do cliente sobre essa relação.
Em cada uma das fases deste mapa, temos que estipular ações específicas que nos ajudam a entender como o cliente está se sentindo naquele específico momento, quais são suas dores e aspirações, o quão próximo ou distante ele está de dar um próximo passo na relação com a empresa e que estratégias podemos tomar para que ele tome uma decisão favorável a essa relação.
Como é possível inferir, naturalmente, o esforço da experiência inclui ainda a integração de profissionais (marketing, recursos humanos, vendas, atendimento) de modo bastante alinhado, de modo que cada passo das jornadas dos clientes se comunique de modo íntegro e a empresa passe uma mensagem clara de satisfação, seja para um consumidor ou para um novo talento dentro de um processo de onboarding, por exemplo.
Clientes internos, externos, histórias de vida e a confiança na base das relações
Mas, mais do que um ponto de viés processual e metodológico, o entendimento do cliente é uma questão de cultura e de confiança. Temos de desenhar trilhas para nos aproximarmos verdadeiramente de nossos clientes, conhecermos e interessarmos-nos por suas histórias, dividir suas aspirações e fidelizá-lo a partir de ações genuínas, transparentes e éticas.
Novamente, o papel do líder aqui é crucial. Pensando nos clientes internos, por exemplo, a pesquisa FIA Employee Experience de 2021 destacou que, dentre os melhores lugares para se trabalhar, a maioria das lideranças tinha o perfil inspirador, enquanto 87% das empresas concordam que a felicidade de seus talentos é uma vantagem competitiva frente a outros negócios.
Já no plano dos clientes externos, que tal percebermos o valor da empatia, uma vez que 68% dos consumidores esperam que as marcas tenham mais empatia segundo a SalesForce – e apenas 37% delas estão atingindo esse anseio?
Ao unirmos esses diferentes valores, tenho convicção de que estaremos mais próximos do tesouro da personalização e da fidelização para os quais leva o mapa da experiência. Uma mapa repleto de histórias em que – parafraseando Ann Handley, um dos maiores nomes do marketing contemporâneo – os clientes são os verdadeiros heróis.